15.2.07

O Labirinto do Fauno – Retrato da Violência Fascista na Espanha de 1944


Muitos sítios sobre cinema classificaram O Labirinto do Fauno como um filme de horror, suspense ou fantasia. O filme é surreal sim mas, aprofundando um pouco mais o olhar, a temática central de O Labirinto trata, de maneira sutilmente poética, de uma das mais violentas e sanguinárias ditaduras fascistas que assolaram o mundo no século XX: a ditadura de Franco, na Espanha. O golpe da aliança burguesa Falange sobre o grupo socialista Frente Popular, vencedor das eleições em 1936, deu início à Guerra Civil Espanhola, que deixou um saldo de mais de 1 milhão de mortos e culminou na tomada do poder pelo general Francisco Franco, em 1939.

Ambientado nas montanhas de Navarra, na Espanha de 1944, o filme usa a fantasia para evidenciar a fragilidade das reações humanas em situações extremas, a realidade “criada” versus a realidade “real”: o mundo mágico da menina Ofelia (lvana Barquero) – onde aparecem fadas, o Fauno e até um grotesco ser que vê através dos olhos que tem nas mãos (Doug Jones, também intérprete do Fauno) – e o mundo real onde um capitão fascista e seu regimento tentam eliminar um dos focos da resistência camponesa.

Ofelia é uma doce menina que cria um mundo imaginário para fugir das mazelas da realidade. Seu mundo é cercado de uma “fantasia simbólica”, em que um fauno promete transformá-la na princesa de seu reino subterrâneo se ela for capaz de realizar três tarefas, testando-a ao ponto de colocar-lhe em risco a vida. A menina, de uma tristeza singular – cumprimentos à pequena atriz –, é o perfeito reflexo da inocência, das tantas inocências roubadas pelos fascistas e seus ideais de poder. Outro destaque é Mercedes (Maribel Verdú), cozinheira do capitão fascista Vidal (Sergi López) e amiga de Ofelia. Mercedes é informante dos guerrilheiros e consegue dar o exato tom da dramaticidade de O Labirinto: é a protagonista da cena mais marcante do filme em que ela, inesperadamente, reage à iminente tortura que o Capitão Vidal lhe prepara – num momento absolutamente empolgante que arranca gritos eufóricos da platéia. Essa cena, aliás, faz par com outra de igual importância que acontece no mundo imaginário de Ofelia.

As duas cenas conseguem traduzir com méritos o argumento do filme. A tortura de Mercedes é confrontada com o acontecimento mais horripilante do mundo subterrâneo – o jantar cujo anfitrião é o “homem pálido”, aquele dos olhos nas mãos –, responsável por externar em Ofelia toda a coragem e sagacidade necessárias para que conseguisse se livrar do terrível monstro. Mercedes, à iminência da tortura, teve que encontrar em si, tal como Ofelia, as mesmas coragem e sagacidade que a livrariam do capitão fascista que estava por torturá-la – este não menos monstro que aquele. Nesse momento, o espectador se questiona sobre qual seria a “realidade” mais terrível, seguramente concluindo, como Ofelia, que o mundo real pode ser bem pior.

Visualmente extraordinário, o filme demonstra beleza e poesia em cada minúcia, nas cenas, nos símbolos ou mesmo nas criaturas do mundo-fantasia. Ponto para o diretor e roteirista Guillermo del Toro, que com um orçamento de apenas US$ 5 milhões (irrisório frente aos padrões americanos) conseguiu produzir um filme incrivelmente original e envolvente. Ponto também para a encantadora fotografia de Guillermo Navarro e as belíssimas criações de figurino e maquiagem de Lala Huete e Eugenio Caballero, incluindo aí a estética do “homem pálido”, um dos seres mais criativamente bizarros já vistos no cinema. Mas o ápice é mesmo o roteiro de Del Toro, que conta a história com emocionante brilhantismo e deixa ainda, de quebra, duas ou três frases emblemáticas, de sonoridade revolucionária. Numa delas, o médico do regimento – também informante da guerrilha (Álex Angulo) –, questionado pelo Capitão Vidal sobre não ter obedecido à sua ordem de manter vivo um guerrilheiro que fora cruelmente torturado (o médico, a pedido do rapaz, aplicara-lhe uma injeção letal), desafia-o com os dizeres: “Obedecer por obedecer, sem pensar, somente o senhor o faz, Capitão!”.

Dos filmes lançados no início de 2007, O Labirinto do Fauno foi, sem dúvida, a salvação dos cinéfilos, insinuando-se já como um dos melhores filmes do ano. Em Recife infelizmente não entrou em cartaz nos grandes cinemas, tendo sido exibido somente no Cinema da Fundação – restringindo assim o acesso à obra. Uma pena, pois a bela criação de Del Toro é realmente imperdível.


Título Original: El Laberinto del Fauno
Duração: 112 minutos
Lançamento (México / Espanha / EUA): 2006
Sítio Oficial: www.panslabyrinth.com
Direção e roteiro: Guillermo del Toro



Pricylla Girão
(MSN: pricyllagirao@hotmail.com )


4 comentários:

Anônimo disse...

O filme é fantástico. O diretor não polpou nenhum detalhe nas cenas mais fortes do filme, pelo contrário. Foi até muito "delicado" ao passar as torturas que nem se comparavam as da realidade.

Anônimo disse...

Realmente o filme é muito introspectivo, ao mesmo tempo em que parece se perder entre ser ou não um filme de fantasia é na verdade uma representação de como a alma humana encontra um refúgio mesmo em situações de extrema brutalidade como a da época em que a história se passa.

Anônimo disse...

eu tbm vi o filme Pri e achei ótimo!

q bom q vc me encontrou no orkut!

abraços do companheiro LEOsubvertsivo!

Anônimo disse...

Na minha opinião, o melhor filme espanhol que já vi ateh hoje..!Gostei muito msm..! BejoOs a todos ..!
Andrezza