2.11.07

“Viagem” - trecho do cap. 24

Visita a uma casa onde repousam trabalhadores da indústria do chá. Passam aqui as férias, um mês por ano. A permanência custa 700 rublos, mas eles apenas pagam 30%; o resto é pago pelo sindicato. [...]

Nas salas vastas, jogadores, entretidos nos lances do xadrez, nem pareciam dar conta da nossa presença. Admirava-me não distinguir neles nenhum dos sinais entre nós perceptíveis na classe obreira: gestos esquivos, olhares suspeitosos, maneiras bovinas, indícios de pensamento lerdo. Parecem desconfiar das criaturas bem vestidas e educadas. Certo crítico, anos trás, me insinuara utilizar num romance os camponeses do Nordeste. Apesar de sertanejo, achava-me incapaz de fazer isso, e antes de viver com esses homens na cadeia, dormindo nas esteiras podres e dividindo fraternalmente os percevejos, não me arriscaria a aceitar o conselho. Aqui se atenuaram as diferenças, afinal desapareceram; os indivíduos que jogam xadrez são aparentemente iguais a nós, nãoo têm motivo para julgar-nos inimigos. Ainda estamos longe deles, é claro: somos estrangeiros – e, embora vivamos do nosso trabalho, fomos criados na reverência aos tipos hábeis que vivem do trabalho dos outros. E admiramos haverem-se apagado aqui as divergências. Ocorrera-me, passeando em Moscou, fazer uma pergunta: – “Mme. Nikolskaya, essa moça aí perto é empregada em oficina ou em repartição pública?”. A Sra. Nikolskaya examinara a mulher por todos os lados e concluíra: – “É impossível saber. Não achamos distinção”. Moscovita, a Sra. Nikolskaya se revelara incapaz de satisfazer-me a curiosidade. Um ofício não é superior a outro – e os homens tendem a uniformizar-se. Essa idéia choca o nosso individualismo pequeno-burguês: achamos vantagem nas discrepâncias, receamos tornarmo-nos rebanho. E nem vemos que somos um rebanho heterogêneo, medíocre, dócil ao proprietário. Queremos guardar o privilégio imbecil de não nos assemelharmos ao vizinho. Enfraquecendo-nos, julgamos-nos fortes. Realmente, somos bestas.

Graciliano Ramos, 09 de agosto de 1952

(Cidade de Gagra – Geórgia, às margens do Mar Negro, na antiga URSS)



22.10.07

A tropa de choque da elite


O mais novo sucesso de público do cinema nacional, “Tropa de Elite”, do diretor José Padilha (o mesmo de “Ônibus 174”), foi lançado em todo o Brasil no dia 12 de setembro, mas, mesmo antes disso, já era fartamente visto devido às cópias piratas vendidas aos milhões nos centros de comércio informal.

Muita polêmica em torno do filme foi levantada: pirataria, corrupção na Polícia Militar, tráfico de drogas, violência, etc.. No entanto, a forma como toda a grande imprensa repercutiu esses temas não passou, como sempre, da superficialidade e da reafirmação dos pontos de vistas burgueses. E mais. Muita gente tem comprado gato por lebre, acreditando que o filme possui um caráter “progressista”.

A crítica que o filme faz à classe média, ao mesmo tempo fiel consumidora de drogas e indignada com a violência, ao ponto de sair às ruas pedindo paz, é contundente, porém esconde o real problema que envolve o tráfico de drogas. Os consumidores da classe média são colocados como os principais responsáveis pela sustentação do tráfico. Não é citada, nem de relance, o quão lucrativo é o tráfico de drogas em todo o mundo, constituindo-se hoje no maior segmento do comércio internacional. Ou seja. Os consumidores não passam de mais uma das peças neste tabuleiro. Quem joga a partida são, na verdade, mega-investidores, todos ligados a grandes empresas, bancos e políticos burgueses.

Denúncia da corrupção na polícia?! É muito fácil falar mal daquilo que já é desmoralizado por consenso. Não há quem não saiba hoje que a polícia age tão “fora da lei” quanto os “bandidos”, e que é a principal parceira do crime organizado, incluindo aí o tráfico de drogas.

Difícil mesmo é engolir a apologia à violência policial que o filme nos apresenta a cada cena. O Bope (Batalhão de Operações Especiais) é a encarnação carioca dos dizeres de Friedrich Engels: “o Estado é um destacamento de homens armados”.

Destacamento de homens muito bem armados e treinados para reprimir e matar. E, ao contrário do que o filme tenta mostrar, o Bope não atua só sobre os “bandidos”, mas sim sobre toda a gente pobre. Atua contra o favelado, como muito bem exemplifica uma das palavras-de-ordem da corporação não utilizada no filme, mas muito bem conhecida de quem mora nas favelas do Rio de Janeiro: “O interrogatório é muito fácil de fazer/ Pega o favelado e dá porrada até doer/ O interrogatório é muito fácil de acabar/ Pega o bandido e dá porrada até matar”.

Outro dado “esquecido” é que o próprio livro que deu origem ao filme (“A Elite da Tropa, escrito por Rodrigo Pimentel, ex-capitão do Bope e co-roteirista do longa) fala de um comandante do Bope que tentou ficar com parte do dinheiro recuperado do assalto a um banco. Isso vai de encontro ao mito que se tenta construir, de que existe a polícia corrupta (a PM), e a polícia incorruptível (o Bope).

Os três principais personagens do filme, o capitão Nascimento (Wagner Moura), e os recrutas Neto (Caio Junqueira) e André Matias (André Ramiro) são mostrados como pessoas de bem, humanas, com seus conflitos pessoas, comuns aos de qualquer outra pessoa, no intento de contrapor à imagem implacável de suas ações.

Nascimento, preocupado com o filho prestes a nascer e com a vida afetiva com sua esposa, busca incessantemente alguém para substituí-lo. É aí que entram os dois jovens policiais, dedicados e honestos, o valente Neto e inteligente Matias, amigos de infância e dispostos a ingressar no Bope por perceberem a corrupção entranhada nos batalhões da PM.

As cenas de tortura são fortes e constantes em “Tropa de Elite”, e, de modo geral, conduzem o espectador a considerá-las uma medida dura, porém necessária, para obter informações que viabilizem a captura dos traficantes. Chega a ser impressionante assistir ao filme no cinema e ver que a sala quase toda solta risos de uma felicidade doentia, misturada a um sentimento de que a justiça está sendo feita.

No entanto, a mesma tortura reverenciada em “Tropa de Elite”, aparentemente direcionada aos “bandidos”, mas que recai sempre também sobre os moradores das favelas, é a mesma tortura utilizada pelas forças de repressão do Estado quando da Ditadura Militar.

Quantos não foram os interrogatórios clandestinos? Quantas pessoas impelidas psicologicamente, feridas, dilaceradas, friamente assassinadas? Só de mortos nestas condições foram quase 400 em todo o país durante duas décadas de domínio do fascismo e da idolatria da repressão sobre os “bandidos” de então, os militantes políticos que lutavam por democracia e pelo socialismo.

Para todos aqueles que ainda sonham e lutam por estes objetivos, fica a certeza de que este aparelho repressivo é a reserva de força para conter os levantes populares. O Bope, assim como o conjunto das polícias e das Forças Armadas, compõe o aparelho estatal sempre a postos para garantir a “normalidade” do sistema, a salva-guarda da propriedade privada e dos privilégios da burguesia. Compõem, todos eles, a tropa de choque da elite.

Rafael Freire

25.5.07

Israel retoma bombardeios e invasões a territórios palestinos

Por volta do dia 11 do mês passado, os dois partidos que dividem o governo da Palestina, o Hamas, do primeiro-ministro Ismail Haniyeh, e Fatah, do presidente da Autoridade Nacional Palestina, Mahmoud Abbas, entraram em confronto aberto devido a divergências quanto à postura do governo de coalizão em relação a Israel. Resultado: a morte de mais de 50 pessoas.

No entanto, não é aí que está o centro do conflito na região. Enquanto os dois grupos não chegam a um consenso de como alcançar o objetivo comum da criação do Estado livre palestino, o governo de Israel se aproveita da situação para bombardear o povo palestino, prender militantes e invadir territórios.

Quase que diariamente, desde o último dia 15, a Força Aérea israelense efetuou disparos de mísseis de alta precisão sobre alvos palestinos, sob o pretexto oficial de acertar bases e coibir o lançamento de mísseis do Hamas sobre o território de Israel. No entanto, as vítimas (mais de quarenta nessa nova escalada de terror) são, em geral, civis, pessoas comuns, mortas dentro de suas casas ou enquanto andavam nas ruas. O conflito pôs fim ao cessar-fogo que vigorava desde novembro de 2006.

Em reunião com altos comandantes militares, o ministro da Defesa de Israel, Amir Peretz, ordenou que o Exército “mantenha o ritmo ofensivo contra o Hamas, tanto em operações contra infra-estruturas terroristas, como contra comandos que se dirijam a lançar foguetes”. E ainda acrescentou: “todo mundo pode ver que a força que utilizamos atualmente é apenas uma fração das possibilidades que estão à nossa disposição”.

Para completar o quadro de arrogância israelense, na madrugada do dia 24, tropas de Israel invadiram o território palestino da Cisjordânia, e prenderam arbitrariamente 33 membros do Hamas, incluindo o ministro da Educação, Naser al Shaer, e o prefeito e o vice-prefeito da cidade de Nablus. “Por meio desta agressão, o governo israelense mais uma vez leva a região a um ciclo de violência, e assume a responsabilidade pelas conseqüências de suas ações”, declarou o porta-voz do palestino.
Nada mais imperialista do que promover a guerra contra uma outra nação mais frágil política e economicamente. Nada mais imperialista do que invadir territórios alheios visando à anexação. E nada mais fascista do que prender militantes políticos sem motivos nem prerrogativas legais. Esse é o verdadeiro conflito da região: uma nação imperialista que tenta a todo custo aniquilar o sonho de soberania de um povo oprimido.

Multinacionais e parlamentares financiam guerra na Colômbia

O líder paramilitar de extrema-direita, Salvatore Mancuso, que hoje se encontra preso, confirmou em recente depoimento à Justiça colombiana que multinacionais norte-americanas financiam a guerra na Colômbia. Mancuso citou as companhias frutíferas Chiquita, Dole, Del Monte e Drummond, além das cervejarias Bavaria e Postobón.

A Chiquita Brands International Co., uma das maiores exportadoras de banana do mundo, já havia reconhecido perante o Departamento de Justiça dos EUA ter financiado os paramilitares. Mesmo assim, a única punição sofrida pela empresa foi o pagamento de uma multa de US$ 25 milhões.

As milícias paramilitares foram criadas no começo da década de 1980, com o apoio dos latifundiários e traficantes de drogas, para conter o avanço da guerrilha de esquerda, que há mais de 40 anos luta para transformar a Colômbia num país soberano. De lá para cá, já praticaram mais de 10 mil assassinatos, além de terem tomado parte no tráfico de drogas e de terem roubado milhões de hectares de terra dos camponeses pobres.

Salvatore Mancuso, de 47 anos, era o chefe da milícia Autodefesas Unidas da Colômbia (AUC). Pesa contra ele o assassinato de cerca de 3 mil pessoas, entre 1999 e 2004. Fato que pode levá-lo a 40 anos de prisão. Bem mais que os 8 anos acordados entre o governo fascista do presidente Álvaro Uribe e os paramilitares, em troca da deposição das armas e dos depoimentos à Justiça.

Além das multinacionais, Mancuso garante que vários integrantes do governo de Uribe também estão envolvidos. Entre eles, o vice-presidente, Francisco Santos, o ministro da defesa, Juan Manuel Santos (que são primos), e o presidente do Partido Conservador, Julio Mazur. Para completar a crise, doze deputados da base governista já estão presos por ligações comprovadas com as milícias.

Os fatos só provam que a guerra e o extermínio humano são o componente principal da política de extrema-direita que toma conta do governo colombiano há anos, e que agora, com o presidente Álvaro Uribe, chegou a níveis insustentáveis.

Em nome da democracia dos ricos, mais terror e roubo contra os camponeses pobres e o povo da Colômbia.

Rafael Freire

2.4.07

Avaliação do PAC




No início do seu segundo mandato, o presidente Lula anunciou o seu Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) e agora tem movimentado sua base no Congresso para que ele seja aprovado. O plano promete “aumentar o emprego e melhorar as condições de vida da população brasileira”. Entretanto, como infelizmente sabemos, não é o governo Lula o mais indicado para falar em cumprimento de promessas.

A estratégia declarada do PAC é criar, através de investimentos públicos diretos, de incentivos fiscais e de reformas na legislação (em especial na legislação ambiental) um ambiente favorável para o investimento privado que, ainda segundo o governo, seria a chave para o crescimento econômico do país. Dessas medidas, a que mais chama a atenção e que com maior destaque aparece estampada nos jornais é a disposição do governo em gastar mais de R$ 500 bilhões de reais em 3 anos (2007 – 2010).

Entretanto, o que mais deveria nos impressionar é que grande parte desse total virá das empresas estatais. Isso nos leva a duas reflexões. A primeira é a importância decisiva das estatais para a economia brasileira. Essas mesmas estatais, operadas pelos tão injustamente difamados funcionários públicos, são agora chamadas a patrocinar quase que sozinhas as obras de infra-estrutura para que as “eficientes” empresas privadas possam prosperar. A outra questão é que essa estratégia de mobilizar as estatais não é modo algum uma novidade na política econômica brasileira. Na verdade, as estatais, desde a década de 70 e em diferentes governos, têm sido obrigadas a fornecer preços subsidiados a empresas privadas com o mesmo declarado objetivo de incentivar os investimentos. Essa política de favorecimento das empresas privadas levou muitas estatais a operarem com prejuízo. Anos depois esse prejuízo foi o principal argumento para a privatização dessas empresas. O fato desse prejuízo ter sido compulsório foi convenientemente “esquecido” pelos defensores da privatização. Espero que dessa vez Lula ou seus sucessores lembrem que esses bilhões farão falta às estatais, principalmente em seus setores de Pesquisa, Ciência e Tecnologia, e terão conseqüências no futuro.

O governo, além de “colocar a faca no pescoço” das estatais para que elas banquem o investimento privado, pretende também praticamente dobrar a renúncia fiscal, aumentando-a de R$ 6,6 bilhões para R$ 11,5 bilhões em apenas um ano (2007-2008). Como se não bastasse, há uma série de outras medidas no mínimo suspeitas como por exemplo a reforma na legislação ambiental, utilização do FGTS na composição de fundos de financiamento, “racionalização do desenho institucional” do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, reforma na lei de licitações e até uma nova reforma na previdência.

Essas medidas terão o resultado anunciado? Provavelmente não. Em primeiro lugar é preciso ter em conta que a chamada “responsabilidade social” dos empresários é uma fantasia que só existe na cabeça das pessoas que temem encarar a realidade como ela realmente é. Os empresários (entendo por empresários os grandes capitalistas) estão interessados no lucro, suas decisões são baseadas em suas expectativas de conseguir o lucro máximo. Isso é tão evidente que na verdade é espantoso alguém afiançar alguma esperança sincera na “responsabilidade social” dos empresários. Sendo assim, mesmo com todo o “ambiente favorável”, mesmo com as estatais fazendo um esforço gigantesco de financiamento, mesmo com os incentivos fiscais, etc. o empresário vai continuar investindo “seu” dinheiro onde obtiver mais lucro. E enquanto o Brasil continuar sendo o país com a maior taxa de juros do mundo, o mais lucrativo continuará sendo a aplicação na órbita financeira (especialmente nos títulos da dívida pública, mais seguros e mais lucrativos) e não o investimento produtivo.

O mais grave, entretanto, ainda não foi dito. “Para não dizer que não falei das flores”, vamos supor que os empresários deixem sua ganância de lado, saiam do mercado financeiro e realmente invistam em atividades produtivas. Mesmo considerando essa hipótese heróica, ainda assim, o PAC não trará a “melhoria nas condições de vida da população”. E aqui temos desmentir uma das maiores falácias da maioria dos comentaristas econômicos dos meios de comunicação: o crescimento econômico NÃO resolve necessariamente o problema do desemprego.

Por quê? Porque na maioria das vezes esse investimento é intensivo em capital e não em trabalho. Ou seja, os empresários para aumentarem sua produção (crescimento econômico) o fazem comprando máquinas novas, utilizando novas tecnologias que utilizam cada vez menos força de trabalho. É portanto perfeitamente possível que o crescimento econômico não seja acompanhado por um aumento significativo da demanda por trabalho. O empresário pode, e na maioria das vezes o faz, comprar uma máquina nova (quem sabe com recursos do BNDES), aumentar sua produção e ainda demitir funcionários. Essa situação fica ainda mais agravada quando se tem em mente a crescente abertura comercial brasileira e a conseqüente concorrência com os produtos importados. Não é a toa que as fases de crescimento econômico do Brasil, inclusive o “milagre brasileiro”, foram em geral acompanhadas de um aumento das desigualdades sociais.

Isso não se trata de maneira alguma de uma novidade. O governo sabe disso perfeitamente. Tanto é que no Plano Plurianual feito no início do primeiro mandato (2004) o governo colocava como centro do crescimento o fortalecimento do mercado interno que obriga de algum modo a uma maior distribuição de renda.

Em resumo, enquanto a desigualdade social brasileira não for colocada como problema central, os diferentes planos econômicos continuaram reféns da “responsabilidade social” do capitalismo que como sabemos é, na realidade, negativa. É preciso, portanto, um maior controle social sobre a economia. Rever as privatizações fraudulentas, diminuir o enorme poder do capital especulativo internacional, realizar as reformas agrária e urbana, enfim, fazer com que a economia trabalhe para o benefício dos trabalhadores e não para o enriquecimento de meia dúzia de especuladores.


Humberto Lima

26.2.07

A guerra da Besta e as bestialidades da guerra


Como se não bastasse o genocídio organizado pelo imperialismo norte-americano contra o povo do Iraque, o qual, oficialmente, se aproxima das 50 mil mortes, os agentes diretos desse crime, os tão enaltecidos soldados yankees, cometem, à surdina, toda uma variedade de bestialidades.

Em março de 2006, os soldados Steven Green, James Barker e Paul Cortez praticaram, de forma premeditada, o assassinato de uma família iraquiana, seguido do estupro de sua filha mais velha, a jovem Abeer Qassim Al Janabi, de apenas 14 anos.

O caso voltou à tona neste mês de fevereiro, porque o soldado Paul Cortez, que agora enfrentou julgamento, revelou em seus depoimentos, com detalhes, como os três planejaram o crime. “Sabíamos que só havia um homem na casa, e que seria um alvo fácil”.

Segundo Cortez, assim que invadiram a casa das vítimas, o soldado Green levou o pai, a mãe e a irmãzinha da garota para um quarto e os executou a tiros. "Durante o tempo em que eu e Barker ficamos estuprando Abeer, ouvi cinco ou seis tiros vindos do quarto. Green saiu do quarto e disse que tinha matado todos eles, que todos estavam mortos. Green então se colocou entre as pernas de Abeer para estuprá-la. Ela ficou se contorcendo, tentando manter as pernas fechadas e dizendo coisas em árabe".

Toda a ação durou cerca de cinco minutos. Então executaram também a menina e atearam fogo em seu corpo, na tentativa de esconder o estupro.

O soldado Green, líder da ação, foi condenado no final do ano passado a 90 anos de detenção num presídio militar. O soldado Barker foi exonerado do exército e aguarda julgamento numa prisão civil. Já o soldado Paul Cortez foi condenado a 100 anos, mas, pelas leis norte-americanos e por um acordo feito no tribunal, pode estar em liberdade condicional dentro de 10 anos.

Contudo, nenhuma condenação apagará mais este episódio bestial. A guerra da Besta norte-americana é, segundo eles dizem, para estabelecer a justiça e democracia no Iraque. Logo vemos que tipo de justiça e democracia eles querem estabelecer. Aquela baseada na violência, no genocídio, nos assassinatos cruéis. Na violência sexual, moral e psicológica. Na violência cultural e econômica. No roubou escancarado das riquezas do Iraque. No extermínio dos obstáculos à dominação mundial do representante maior do capitalismo atual.

Mas a Besta está cambaleante, encurralada, e a outra besta que a preside, quer agora enviar mais soldados (ou seria mais estupradores?), mais armamento, mais dinheiro, para prosseguir com sua guerra insana. Os fatos têm provado, no entanto, que quanto mais eles investem na guerra, mais a guerra investe contra eles.

Rafael Freire

25.2.07

Harry, o nazista


O Ministério da Defesa da Inglaterra informou que o príncipe Harry será enviado ao Iraque. Harry é o segundo filho do príncipe Charles com a princesa Diana. Ele é conhecido pelas farras que promove, sempre com muita bebida e drogas, às custas do dinheiro público. Em 2005, em uma dessas festas, apareceu fantasiado com um uniforme nazista, com a suástica na braçadeira.

Esse ato é uma prova não apenas de ignorância política como também um profundo desrespeito pelo povo da Inglaterra. Durante a II Guerra Mundial, a Inglaterra foi brutalmente bombardeada por Hitler que só não a invadiu porque “ele não se atreveria a concentrar suas forças na conquista da Inglaterra, enquanto no palco continuasse presente o Exército Vermelho”, nas palavras do historiador inglês Liddel Hart. Durante o conflito 300 mil ingleses morreram.

Agora, não satisfeito apenas com a fantasia, o príncipe Harry pretende tornar realidade seu sonho nazista. Para alguns, essa é uma última tentativa de conseguir algum apoio popular à guerra. Como todas as outras tentativas anteriores, essa também deverá ser inútil. A invasão ao Iraque é cada vez mais vista pelo mundo como o que ela realmente é: uma guerra imperialista e covarde, organizada por uma quadrilha de empresas bélicas e petrolíferas, com o único interesse de se apoderar das riquezas iraquianas. Além disso, a brava resistência iraquiana já expulsou do Iraque vários países, entre eles a Itália e a Espanha. A própria Inglaterra, que no início da invasão tinha mais de 30 mil soldados no Iraque, hoje tem apenas 6 mil e o governo inglês já anunciou que pretende retirar todas as suas tropas.

Em um gesto de hipocrisia sem tamanho, Harry declarou que “não poderia ficar sentado em casa enquanto meus amigos lutam por nosso país”. Mentira! Harry vai ser escoltado, dia e noite, pela SAS, a força de elite, mais bem treinada e equipada, do exército britânico e os próprios comandantes já admitem que ele pode voltar mais cedo para casa. Ou seja, Harry vai ficar escondido em algum buraco blindado enquanto os soldados britânicos praticam todos os tipos de crimes de guerra contra o povo iraquiano.

Cada diamante da família real inglesa foi roubado às custas de milhares de vidas humanas. Cada jóia da Coroa traz a marca do sofrimento e das atrocidades que o imperialismo inglês cometeu em todos os continentes do mundo. O luxo e a pompa dos palácios ingleses é financiado com a fome e as humilhações que sofreram e ainda sofrem populações inteiras. O imperialismo inglês roubou as riquezas e escravizou o continente africano por séculos. Ao sair, deixou como lembrança de sua bestialidade milhares de minas terrestres que ainda mutilam crianças diariamente. Harry, o nazista, ao decidir unir-se ao fascismo, não faz nada mais que seguir a tradição de sua decadente e vergonhosa família.

Humberto Lima

15.2.07

O Labirinto do Fauno – Retrato da Violência Fascista na Espanha de 1944


Muitos sítios sobre cinema classificaram O Labirinto do Fauno como um filme de horror, suspense ou fantasia. O filme é surreal sim mas, aprofundando um pouco mais o olhar, a temática central de O Labirinto trata, de maneira sutilmente poética, de uma das mais violentas e sanguinárias ditaduras fascistas que assolaram o mundo no século XX: a ditadura de Franco, na Espanha. O golpe da aliança burguesa Falange sobre o grupo socialista Frente Popular, vencedor das eleições em 1936, deu início à Guerra Civil Espanhola, que deixou um saldo de mais de 1 milhão de mortos e culminou na tomada do poder pelo general Francisco Franco, em 1939.

Ambientado nas montanhas de Navarra, na Espanha de 1944, o filme usa a fantasia para evidenciar a fragilidade das reações humanas em situações extremas, a realidade “criada” versus a realidade “real”: o mundo mágico da menina Ofelia (lvana Barquero) – onde aparecem fadas, o Fauno e até um grotesco ser que vê através dos olhos que tem nas mãos (Doug Jones, também intérprete do Fauno) – e o mundo real onde um capitão fascista e seu regimento tentam eliminar um dos focos da resistência camponesa.

Ofelia é uma doce menina que cria um mundo imaginário para fugir das mazelas da realidade. Seu mundo é cercado de uma “fantasia simbólica”, em que um fauno promete transformá-la na princesa de seu reino subterrâneo se ela for capaz de realizar três tarefas, testando-a ao ponto de colocar-lhe em risco a vida. A menina, de uma tristeza singular – cumprimentos à pequena atriz –, é o perfeito reflexo da inocência, das tantas inocências roubadas pelos fascistas e seus ideais de poder. Outro destaque é Mercedes (Maribel Verdú), cozinheira do capitão fascista Vidal (Sergi López) e amiga de Ofelia. Mercedes é informante dos guerrilheiros e consegue dar o exato tom da dramaticidade de O Labirinto: é a protagonista da cena mais marcante do filme em que ela, inesperadamente, reage à iminente tortura que o Capitão Vidal lhe prepara – num momento absolutamente empolgante que arranca gritos eufóricos da platéia. Essa cena, aliás, faz par com outra de igual importância que acontece no mundo imaginário de Ofelia.

As duas cenas conseguem traduzir com méritos o argumento do filme. A tortura de Mercedes é confrontada com o acontecimento mais horripilante do mundo subterrâneo – o jantar cujo anfitrião é o “homem pálido”, aquele dos olhos nas mãos –, responsável por externar em Ofelia toda a coragem e sagacidade necessárias para que conseguisse se livrar do terrível monstro. Mercedes, à iminência da tortura, teve que encontrar em si, tal como Ofelia, as mesmas coragem e sagacidade que a livrariam do capitão fascista que estava por torturá-la – este não menos monstro que aquele. Nesse momento, o espectador se questiona sobre qual seria a “realidade” mais terrível, seguramente concluindo, como Ofelia, que o mundo real pode ser bem pior.

Visualmente extraordinário, o filme demonstra beleza e poesia em cada minúcia, nas cenas, nos símbolos ou mesmo nas criaturas do mundo-fantasia. Ponto para o diretor e roteirista Guillermo del Toro, que com um orçamento de apenas US$ 5 milhões (irrisório frente aos padrões americanos) conseguiu produzir um filme incrivelmente original e envolvente. Ponto também para a encantadora fotografia de Guillermo Navarro e as belíssimas criações de figurino e maquiagem de Lala Huete e Eugenio Caballero, incluindo aí a estética do “homem pálido”, um dos seres mais criativamente bizarros já vistos no cinema. Mas o ápice é mesmo o roteiro de Del Toro, que conta a história com emocionante brilhantismo e deixa ainda, de quebra, duas ou três frases emblemáticas, de sonoridade revolucionária. Numa delas, o médico do regimento – também informante da guerrilha (Álex Angulo) –, questionado pelo Capitão Vidal sobre não ter obedecido à sua ordem de manter vivo um guerrilheiro que fora cruelmente torturado (o médico, a pedido do rapaz, aplicara-lhe uma injeção letal), desafia-o com os dizeres: “Obedecer por obedecer, sem pensar, somente o senhor o faz, Capitão!”.

Dos filmes lançados no início de 2007, O Labirinto do Fauno foi, sem dúvida, a salvação dos cinéfilos, insinuando-se já como um dos melhores filmes do ano. Em Recife infelizmente não entrou em cartaz nos grandes cinemas, tendo sido exibido somente no Cinema da Fundação – restringindo assim o acesso à obra. Uma pena, pois a bela criação de Del Toro é realmente imperdível.


Título Original: El Laberinto del Fauno
Duração: 112 minutos
Lançamento (México / Espanha / EUA): 2006
Sítio Oficial: www.panslabyrinth.com
Direção e roteiro: Guillermo del Toro



Pricylla Girão
(MSN: pricyllagirao@hotmail.com )


12.1.07

Estamos com Chávez e com o povo da Venezuela!


Depois de ser reeleito com uma vitória incontestável, Hugo Chávez anuncia o surgimento de uma nova república socialista: a República Socialista da Venezuela. Como não poderia deixar de ser, a imprensa conservadora do Brasil e do mundo não tem poupado Chávez de seus clichês e preconceitos anticomunistas.


Dizem que Chávez é contra a liberdade de expressão. Mas não falam que as empresas de rádio e TV privadas da Venezuela não têm moral para falar de liberdade nem de democracia pois deram total e irrestrito apoio ao golpe de Estado organizado pelos Estados Unidos em 2002. Dizem que Chávez é um ditador, mas não dizem que ele venceu todas as eleições que disputou e que a Constituição da Venezuela é mais democrática de todas, pois foi aprovada em plebiscito com o voto de todos os cidadãos. Acusam Chávez de querer se manter indefinidamente no poder quando na verdade uma das marcas de seu governo é justamente retirar do poder as máfias que há décadas lucram milhões com a corrupção do dinheiro público. Anunciam o “socialismo do século XXI” como sendo algo esdrúxulo e fantasioso. Entretanto, vivemos no século XXI e esdrúxulo seria se Chávez quisesse implantar o socialismo em um século que já acabou.


A verdade é que essa imprensa conservadora e a burguesia mundial fizeram um grande esforço para acreditar numa mentira que eles mesmo inventaram: de que o socialismo havia acabado. Achavam que com o exemplo do fim da União Soviética, com o controle dos grandes meios de comunicação e com eleições subordinadas ao poder financeiro, estavam garantidos. Erraram! Para quem tem hoje entre 15 e 25 anos o fim da URSS não teve o mesmo impacto que para os velhos pseudo-comunistas que arriaram suas bandeiras no começo da década de 90 e o poder financeiro não pode esconder indefinidamente a injustiça e a exploração que o capitalismo faz sentir na pele todos os dias.


Chávez está certo. Organiza a economia para que suas riquezas sejam usadas para o bem do povo. Investe maciçamente em educação e saúde. Chama o povo para participar ativa e conscientemente da vida política do país. Um aula de democracia para qualquer tecnocrata com nojo do povo que defende uma democracia de fachada nos moldes dos EUA, onde dois partidos quase iguais se revezam no poder e as eleições são inacessíveis para um cidadão comum.


Se Chávez e o povo venezuelano vão conseguir seus objetivos, ainda não podemos afirmar. Os desafios são muitos e a pressão será cada vez maior. Os EUA falam já abertamente que é preciso “rediscutir o conceito de soberania”. Mas são inegáveis os avanços que foram conseguidos nessa última década. Neoliberalismo, privatizações e outras coisas - que fizeram o lucro dos grandes monopólios internacionais e a miséria dos trabalhadores - são hoje rechaçados pelo povo em todos os países, inclusive o Brasil. Ventos novos e livres começam a soprar em todos os cantos do mundo, e hoje, principalmente na Venezuela.


Recentemente, foi reaberto em Moscou, após dois meses de reformas, o
mausoléu onde está o corpo de Lênin. Algumas pessoas que visitaram o local repararam que havia uma coisa diferente: disseram que Lênin parecia estar sorrindo...


Humberto Lima