Para nós, brasileiros, falar de Arquitetura é quase o mesmo que falar de Oscar Niemeyer. Este arquiteto, que em 15 de dezembro de 2007 completou 100 anos de vida, não é somente um dos maiores ícones mundiais da Arquitetura Moderna. É, sobretudo, um exemplo de trabalho e dedicação.
Sua Arquitetura é admirada em todo o mundo. Seus edifícios mais famosos – o conjunto da Pampulha (MG), a Casa das Canoas (RJ), o Palácio da Alvorada e a Catedral de Brasília, entre outros – são um deslumbramento aos olhos; transformaram-se em símbolos. É a integração da curva, da leveza arquitetural e da sedução visual; inseparáveis em cada uma de suas obras. E ele, o arquiteto apaixonado pelas infinitas possibilidades do concreto armado.
O documentário A Vida é um Sopro, com direção e roteiro de Fabiano Maciel, lançado em meados de 2007, foi feito em homenagem ao centenário desse homem que, com o gesto do desenho, conseguiu transformar a história da Arquitetura Moderna Brasileira e fincá-la no rol das obras dos grandes mestres da Arquitetura do século XX (recebeu, inclusive, o título de “Arquiteto do Século XX” pelo Conselho Superior do Instituto de Arquitetos do Brasil, em 2001).
Será possível contar a história de um povo através de sua Arquitetura? O questionamento que aparece no sítio oficial do documentário pode ser respondido de maneira bastante simples: Oscar Niemeyer – assim como os gregos e romanos antigos –, por meio de seus edifícios-símbolo, conseguiu mostrar a todo um povo que a Arquitetura é, de fato, a marca mais importante do homem por onde ele passa. Porque a Arquitetura permanece.
O filme foi dividido em quatro partes. A primeira mostra sua história pessoal e a descoberta da Arquitetura. A segunda, a “cruzada” que foi a construção de Brasília, no final da década de 1950. A terceira e a quarta partes foram reservadas ao Oscar pensador, filósofo e comunista. É nesse momento que ele expõe o que passou no exílio durante a ditadura militar, explica seus monumentos de protesto e seus pensamentos acerca da sociedade. Tudo isso acompanhado de, obviamente, inúmeros edifícios, esculturas, casas, croquis, enfim, de seus mais representativos projetos e muitos desenhos. Também estão presentes depoimentos de críticos e amigos, entre eles José Saramago (escritor português), Chico Buarque (compositor), Ferreira Gullar (poeta e crítico de arte), Eduardo Galeano (escritor uruguaio). Este último disse:
“É sabido que Oscar Niemeyer odeia o capitalismo e odeia o ângulo reto. Contra o ângulo reto, que ofende o espaço, ele tem feito uma arquitetura leve como as nuvens, livre, sensual, que é muito parecida com a paisagem das montanhas do Rio de Janeiro. São montanhas que parecem corpos de mulheres deitadas, desenhadas por Deus no dia em que Deus achou que era Niemeyer.”
Uma bela viagem visual por suas mais significativas obras – esse é um dos principais motes do filme, que além de nos fazer conhecê-las, faz-nos também compreender o processo de concepção de cada uma delas. E assim Niemeyer fala de Brasília, da singularidade arquitetural de sua catedral e da concepção estrutural dos palácios, em especial o Alvorada. Mostra a idéia do Museu de Arte Contemporânea de Niterói-RJ (carinhosamente apelidado de “Disco Voador”); a concepção arquitetônica clara e simples da sede do Partido Comunista Francês e seu auditório semi-enterrado; a Universidade da Argélia; a sede da ONU em Nova Iorque.
Todos os projetos apresentados no documentário são explicados e redesenhados pelo próprio Niemeyer enquanto é entrevistado, mostrando como desenvolve seu processo projetual e como chega às soluções arquitetônicas: algumas de uma simplicidade impensável, outras mais caprichosas. Todas, porém, belas na busca da forma pela forma.
Outro aspecto importante em A Vida é um Sopro é fazer notar que, junto ao mestre, estão muitos outros ícones: o trabalhador, o operário, o pensador, o intelectual, o revolucionário. É comovente e incomum encontrar um homem que, aos 100 anos, trabalhe tanto quanto na época em que tinha 30. Naquele momento, participava da construção do Movimento Moderno ao lado de outros grandes intelectuais e artistas e, posteriormente, trabalhou inexoravelmente a construção de Brasília. Hoje, diariamente, o velho Oscar passa o dia inteiro em seu escritório, projetando. Até parece que toda a sua lucidez vem daí, da consciência de que o trabalho é o motor que dignifica a existência dos homens.
É um prazer para mim, arquiteta, falar de Oscar Niemeyer. Mas ainda melhor do que falar de sua Arquitetura de belas e orgânicas formas é reconhecer nele a consciência da busca por um mundo melhor. Certa vez, ele disse: “O que me incomoda não são os desacertos da vida, mas a dor imensa dos mais pobres – diante do sorriso indiferente dos abonados”.
Feliz aniversário e muitos outros anos de vida, companheiro Oscar.
Pricylla Girão, arquiteta
Sítio Oficial: www.avidaeumsopro.com.br
Direção e Roteiro: Fabiano Maciel
Direção de Fotografia: Marco Oliveira e Jacques Cheuiche
Produção: Santa Clara Comunicação
Duração: 90 minutos
Lançamento: 2007